Suor. Calafrios. Nervosismo. Pânico. Quem tem medo de voar sabe que passa por tudo isso quando tem de enfrentar uma viagem de avião.
Um livro recém-lançado nos Estados Unidos tenta ajudar essas pessoas, reconhecidas como fóbicas. Sim, o medo de voar é uma doença.
Autora da obra "Safe Journey" (viagem segura), a americana Julia Cameron começou a ter medo há dois anos, quando se mudou de Nova York para Santa Fé. "Passei a ter que viajar com frequência e o que era normal [voar] virou algo apavorante", diz ela.
Com a obra -que não tem previsão de lançamento no Brasil, mas pode ser comprada na versão e-book-, Julia achou que pudesse vencer o medo. Um de seus conselhos? "Pegue uma caneta e escreva uma oração em um papel."
Mas um dos primeiros passos para enfrentar o medo, segundo psicólogos que trabalham com fóbicos, é entender que não é algo racional. Dados comprovam: o avião é mais seguro que o carro.
Em 2012, segundo a Infraero, 172.536.852 pessoas voaram no Brasil. E não houve nem um acidente com voo comercial de passageiros. Já quando se trata de carros, só na capital paulista, 1.231 pessoas morreram no mesmo período, de acordo com a CET.
"O passageiro deve focar na realidade", diz a psicóloga Rosana Dorio Bohrer, fundadora do Instituto Condor, que oferece tratamento para fóbicos.
Outra dica que ela dá é se distrair -leve livros, filmes ou músicas.
"Quando houver uma turbulência, pense: 'É só uma turbulência'", diz Marcelo Victorino, comandante da Gol.
Após aula, fóbicos enfrentam ponte aérea
No mês passado, um grupo de 30 pessoas concluiu o curso Medo de Avião, ministrado pela psicóloga Elvira Gross, em São Paulo.
As aulas eram apoiadas em bate-papos em grupo. Na última etapa, uma conversa com um comandante da Gol, uma visita a um avião estacionado, uma aula em um simulador de voo.
Depois, a "prova" final: um bate e volta entre a capital paulista e o Rio de Janeiro. Das 30 pessoas que pagaram R$ 3.800 pelas aulas mais o bilhete aéreo, cinco não apareceram na viagem.
O voo era às 10h10. Os 25 que persistiram chegaram por volta de 8h a Congonhas "para ir se acostumando", de acordo com Elvira.
"A ideia é que eles vejam que as outras pessoas não estão com medo, que é hora de pensar em outra coisa."
A técnica dava resultado. Na fila do check-in, ninguém parecia estar nervoso. "Ah, ainda não estamos lá em cima, né?", disse a jornalista Aline Trevisan, 29, que nunca havia voado.
Em direção ao portão de embarque, o grupo abordou figuras famosas, como Amyr Klink e Neguinho da Beija-Flor. Enfim, distraíam-se antes do voo, acompanhado pela reportagem da Folha.
Era a hora de entrar no avião. "Aí o nervoso começa", contou Aline. Sentaram-se depois de cumprimentar os comissários. Uns continuaram a conversar. O assunto? O medo, sempre o medo. Outros preferiram se concentrar.
Quando o avião começou a decolar, mãos se apertaram. Ao menos, três pessoas do grupo choravam, e a maioria fechou os olhos.
Todos, porém, seguiram a dica da professora: contaram os segundos e respiraram com calma. E contaram em voz alta, como se fosse a contagem regressiva para a virada do ano.
Os passageiros ao lado estranhavam, até que o comandante anunciou pelo alto-falante que levava um "grupo especial". Eram eles, as pessoas com medo de voar.
Um dos passageiros comentou com a mulher: "Não sabia que tinha gente assim".
"Conseguimos! Não acredito! Vamos para Paris hoje?", gritou, já no alto, a professora Evaine Cabral, 47.
Os cerca de 45 minutos de voo transcorreram tranquilamente. O pior da experiência já tinha passado -para grande parte deles, o maior medo era a decolagem.
Olha a pista chegando
O nervosismo reacendeu na hora de pousar. A vista para o Rio ajudava -não para todos, só para quem tinha coragem de olhar pela janela.
Para a alegria do grupo, o avião finalmente parou. Todos os passageiros bateram palmas.
"Foi tenso, mas consegui", disse a comerciante Rosana Peres Ferreira, 50. "Agora vou fazer pequenos voos para ir em outubro com meu filho para a Disney".
Ela nunca viajou de avião com seu filho de oito anos. "Nem para o Beach Park, em Fortaleza, eu fui", contou. Num canto do aeroporto Santos Dumont, a nutricionista Tatiana Moreira Bueno ligou para a casa.
"Filho, a mamãe conseguiu. Agora a gente pode ir para a Disney", disse. O medo dela de voar começou justamente quando o filho nasceu, 13 anos antes.
Medo foi maior
"Não consegui." Richard Khouri, 40, comerciante, foi um dos que não apareceram para o voo. "Fiquei em pânico na aula em que entramos em um avião parado", lembra.
"Não conseguiria ficar nele lá no alto." Richard não foi nem ao simulador, que, segundo os que participaram, ajudou a enfrentar o medo.
"Paguei R$ 4.200 pelo tratamento e não me arrependo", diz. "Ficaria arrependido se não tivesse tentado." Agora, ele vai "dar um tempo para a cabeça".
Fonte: Folha de S.Paulo
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